PONTO DE ÔNIBUS

Nova geração de busólogos promove encontro

O cobrador Diego Dubiginski (à esquerda), organizador da reunião


Não basta trabalhar como cobrador. Tem que ser busólogo. Pelo menos é assim que Diego Dubiginski, 19 anos, encara sua relação com o transporte público coletivo.

Aficionado por ônibus desde criança, ele uniu o útil ao agradável e hoje atua na linha Fazendinha, da Auto Viação Água Verde. Também mantém o site Ônibus de Curitiba, dedicado à busologia – uma espécie de hobby que envolve a troca de informações sobre carrocerias, chassis, sistemas de integração e políticas públicas para o setor.

No último sábado, Dubiginski reuniu cerca de 50 busólogos curitibanos que participam ativamente do fórum de discussão disponível em sua página. O encontro aconteceu num ônibus emprestado, estacionado no Parque Barigüi, onde a turma passou a tarde conversando.

Graças à internet, busólogos de todas as partes descobriram que não estavam sozinhos. Em janeiro, por exemplo, um grupo de Campinas (SP) veio a Curitiba para conhecer seus colegas locais e, é claro, passear de ônibus pela cidade que é referência no assunto.

Mas no sábado, no Barigüi, a situação era diferente. Pela primeira vez, uma nova geração de adeptos da busologia se encontrava pessoalmente. Nova mesmo: 90% dos participantes estão na casa dos 20 e poucos anos.

Lucas Pereira, um dos mais animados, tem apenas 13. O garoto conta que, além de estudar tudo o que envolve o transporte coletivo, costuma desenhar veículos e criar empresas fictícias para brincar com os amigos. Sem contar o hábito, quase um vício, de fotografar ônibus.

Aliás, todos ali mostravam, orgulhosos, seus álbuns pessoais. ‘‘Todo mundo aqui é louco mesmo’’, confessa Danilo Vieira, 28, busólogo desde pequeno e hoje funcionário de uma empresa de sistemas de automação. ‘‘Em vez de estudar, eu ficava na janela do quarto controlando as linhas. ‘Subiu o 878, desceu o 879’’’, lembra.

Vestindo camisetas com os dizeres ‘‘Ônibus de Curitiba: Meu Orgulho, Minha Paixão’’, os rapazes tranformaram o ônibus estacionado no Barigüi em uma verdadeira exposição temática. Cada um com seu arsenal de fotos, catálogos, miniaturas, jornais e revistas antigas. ‘‘Isso todos trouxeram. Mas comida e bebida, como combinamos pela internet, ninguém se lembrou de trazer’’, brinca Aparecido Pinheiro, 36, talvez o mais velho da turma.

Outro ‘‘veterano’’, Ronaldo dos Santos, 32, também tira sarro da própria mania. ‘‘Não tem jeito. Respiro ônibus 24 horas por dia’’. Pinheiro, ex-motorista, é técnico de segurança da Viação Água Verde, que cedeu o veículo para o encontro. Ronaldo, além de dirigir um ônibus da Viação Colombo, é um dos organizadores da Exposição de Ônibus Novos e Antigos (Exponi), promovida pelo grupo Omnibus do Brasil, fundado em 1991. Também representa no Paraná a revista especializada InBus Transport.

Mas a maioria dos busólogos presentes não faz do hobby uma profissão. Até porque são tão jovens que mal saíram dos bancos escolares. Poderiam estar falando sobre carros ‘‘tunados’’ ou motos envenedadas, porém se dedicam a uma paixão nem sempre compreendida.

‘‘As pessoas acham estranho eu gostar de ônibus. Estranho é colecionar selos. Por que você vai comprar um selo se não vai mandá-lo para ninguém? Eu, pelo menos, ando de ônibus todos os dias’’, diz o bancário Eduardo Gomes, 24.
Por essas e outras, não há mulheres no grupo, ainda que alguns dos membros sejam casados. ‘‘Minha esposa achou diferente no início, mas hoje ela até anota placas e prefixos para mim’’, revela Eduardo. ‘‘Atualmente, eu estou com a mulher na garagem e o ônibus na cama’’, diverte-se Ronaldo, recém-separado.

DEBATE ACALORADO

Ao contrário dos fãs de carros, os busólogos não se limitam a falar sobre o design, a potência e o conforto dos veículos. Quando o assunto é o transporte de Curitiba, a conversa ganha um tom mais sério. Para eles, o grande vilão do sistema é o trânsito, cada vez mais inchado e complicado.

‘‘Hoje em dia, você pode financiar um automóvel em até 84 meses. Tem muito carro na rua. E quando surge uma campanha como a do Dia Sem Carro, ninguém se conscientiza. Parece que as pessoas saem de carro de propósito’’, reclama Ronaldo.

O debate também passa pelo preço da passagem. ‘‘Poderia ser mais barato, sim. Basta remanejar os custos e rever os impostos envolvidos na atividade’’, afirma Pinheiro. ‘‘Um cobrador ganha R$ 676 por mês. Se ele tem mulher e dois filhos que usam o transporte coletivo todos os dias, calcule quanto do salário não vai só para ônibus’’, completa.

Políticas públicas à parte, a conversa esquenta mesmo quando vem à tona a obsessão do momento: dois ligeirinhos novos da viação Nossa Senhora do Carmo que estão para chegar à cidade. Com chassi Volvo B7R e carroceria Marco Polo, fabricantes venerados pela turma, os veículos são esperados com ansiedade.

Levando-se em conta que a prefeitura promete colocar em circulação 293 ônibus zero quilômetro até o fim do ano, não vai faltar assunto para os busólogos de carteirinha.


por OMAR GODOY
com foto de THEO MARQUES
maio de 2008

Nenhum comentário :