BAILÃO COM AR-CONDICIONADO

Mais festeiro e menos romântico,
estilo sertanejo universitário
toma conta da noite de Curitiba


Gurlan Rossette, um dos sócios do Woods: casa para ‘‘gente bonita’’

Música ‘‘de festa’’ atrai cowboys e cowgirls curitibanos

Eric & Matheus: atenção para os internautas

Christian & Miguel: shows de terça a domingo, às vezes mais de um por noite


Foi-se o tempo da dor de corno. E também do novo-riquismo ‘‘chique no úrtimo’’. Sempre presente no inconsciente coletivo tupiniquim, a cultura country-sertaneja vive mais uma boa fase, desta vez entre o público jovem.

Avessa aos bailões da periferia, essa nova turma não quer saber da tristeza do Jeca e nem do fio de cabelo no paletó. Na base do sexo, álcool e vanerão, o movimento conhecido como sertanejo universitário preconiza uma espécie de hedonismo caipira, mas sem perder os confortos da cidade grande.

Em março, Curitiba se consolidou como um pólo do gênero ao reunir 30 mil pessoas na Pedreira Paulo Leminski, durante um megafestival de música country. A cidade também sediou uma rave sertaneja e até um luau rural, o que confirma o caráter abrangente do movimento.

Por aqui, há quem diga que o estouro da boiada se deve ao bar Woods, no Bacacheri. Inaugurado em 2005, o point oferece uma estrutura sofisticada para os cowboys e cowgirls, com direito a ar condicionado, sistema informatizado, tevês de plasma e mais de 40 garçons à disposição.

Ou seja: um ambiente que nada lembra os barracões suarentos fora do eixo central. ‘‘Antes do Woods, era brega curtir música sertaneja’’, afirma Marcelo Valle, apresentador do programa de TV Na Balada (CNT), que vende espaco para a divulgação de casas noturnas.

O Woods também conta com uma versão pub, mais intimista, em pleno Batel. Mas é a matriz que permanece como o principal ponto de encontro dos sertanejos classe A. ‘‘Falando friamente, era um público feio que freqüentava as baladas country em Curitiba. Montamos o bar justamente para chamar um pessoal mais selecionado’’, diz Gurlan Rossette, um dois seis sócios do empreendimento.

Atualmente, a cidade conta com pelo menos outras 15 casas voltadas para os sons sertanejos. Nem todas recebem apenas o ‘‘pessoal selecionado’’, mas a maioria teve de se adaptar ao novo perfil da audiência. Gente que trocou o pagode, o funk e a música eletrônica pela viola caipira – e hoje chacoalha o esqueleto no Victoria Villa, Rancho Brasil, Rodeo, Santa Fé, Seis e Meia, Armazém do Cuca, Território Sertanejo, etc.

É o caso de Rosângela Velozo, 25 anos, formada em Sistemas de Informação. Ela conta que ainda vai a raves, mas tem preferido as baladas sertanejas porque se identifica mais com o som. ‘‘Meus pais vieram do interior, ouvi esse tipo de música a minha vida inteira’’.

Bancária e estudante de Administração de Empresas, Luciana Salomão, 29, acredita que as baladas country têm mais ‘‘emoção’’. ‘‘É um som feito para dançar junto, tem uma química’’, explica.

A dança, por sinal, é a senha para entender a popularidade das duplas atuais. ‘‘O ritmo é animado’’, define a promotora de eventos Fernanda Mendes, 21. ‘‘E as letras não são melosas como as de antigamente’’, emenda.

De acordo com as cowgirls, o visual ideal exige minissaias ou jeans apertadíssimos, cintos com fivelas enormes e as onipresentes botas de bico fino. Chapéus são mais usados pelo rapazes, que só por descuido deixam as camisas saírem das calças.

Movidos a whisky com energético, os sertanejos universitários também se organizam em excursões para rodeios e festas agropecuárias realizadas fora de Curitiba. Sem contar os eventos organizados por comissões de formatura, que encontraram no country um ótimo chamariz para angariar fundos.

Christian & Miguel, Eric & Matheus, Henrique & Diego, Júnior & Rodrigo, Álvaro & Daniel, Marcos & Dalton são algumas das duplas paranaenses em voga no circuito de casas noturnas. Tratados como semi-celebridades locais, os cantores carregam uma verdadeira comitiva de amigos e fãs por onde tocam – ainda que a maioria dos neosertanejos nem faça idéia de quem está em cima do palco.

‘‘O Woods é só modinha. O pessoal vai lá e nem dança, só fica desfilando’’, critica a estudante Bruna Catafesta (ela jura que não é apelido!), 18 anos. Ela prefere o Rancho Brasil, mais antigo e tradicional, na Avenida das Torres.

O surgimento de casas noturnas como o Woods e a proliferação das faculdades pelo interior do País são alguns dos fatores que explicam o renascimento da cultura sertaneja. Mas sem as duplas da geração anos 2000, ainda estaríamos sob o reinado dos dois filhos de Francisco.

Nomes como César Menotti & Fabiano, Victor & Léo, Edson & Hudson e Fernando & Sorocaba são pequenos fenômenos nacionais, catapultados à fama sem precisar do esquema das gravadoras multinacionais. Construíram suas carreiras na estrada e na internet, contando apenas com o boca-a-boca dos fãs. Se hoje assinam bons contratos e aparecem na TV, é porque entenderam a velha máxima mineira de que ‘‘todo artista tem de ir aonde o povo está’’.

Em linhas gerais, o sertanejo universitário é uma versão pop do caipira tradicional. O som, mais acelerado e dançante, traz influências de vanerão, rock, forró e até axé music (certos hits chegam a ter suas próprias coreografias). Já as letras... Bem, elas não primam exatamente pelo lirismo. ‘‘A gente canta para quem gosta de festa. Fala sobre tomar umas, ficar alegre e azarar a mulherada’’, resume Miguel, que faz dupla com Christian.

DUPLAS SE ADAPTAM AOS NOVOS TEMPOS

No auge do boom sertanejo dos anos 90, as duplas não saíam de casa sem uma grande estrutura por trás. Eram dezenas de assessores, produtores, técnicos de som e luz, músicos de apoio, bailarinos e aspones em geral. As gravadoras, empolgadas com as vendas milionárias, só faltavam carregar os artistas no colo.

Mas a febre passou, a indústria do disco faliu e somente os maiores nomes do gênero se mantiveram sob os holofotes da grande mídia. Barradas das FMs e TVs, as duplas iniciantes tiveram de se adaptar aos novos tempos. Tempos de internet, MP3 e, principalmente, contato direto com o público.

‘‘Os meninos não têm um fã-clube oficial, mas nós cadastramos todo mundo que visita o site e a comunidade do Orkut’’, diz Carla Liberatore, que trabalha com Christian & Miguel. ‘‘Conseguimos lotar uma casa só com os amigos e esses contatos’’, garante.

Atualizar o mailing e responder todos os e-mails também é tarefa obrigatória no dia-a-dia de Eric & Matheus. De acordo com os cantores, até os radialistas já encaram a internet como um termômetro de popularidade dos artistas. ‘‘Muitos contam que não dão conta de ouvir as centenas de CDs enviados para as emissoras. Então jogam o nome da dupla no Google e, dependendo do número de citações, apostam naquele artista’’, conta Matheus.

Christian e Miguel, juntos há três anos, largaram seus empregos para se dedicar exclusivamente à música. Christian (nome de batismo Ismael), 31 anos, foi jogador profissional de futebol, com passagens pelo Atlético Paranaense, Paraná e Internacional, entre outros clubes. Miguel, 29, é formado em Processamento de Dados, mas já trabalhou como carteiro, gari, jardineiro e músico de apoio.

Atualmente, os dois cantam de terça a domingo, às vezes em mais de um lugar por noite. Se o show inclui sua própria banda e dançarinos, o cachê fica em torno de R$ 3 mil. Valor que eles esperam ver crescer a partir de junho, quando seu primeiro CD e DVD, gravado ao vivo, chegar ao mercado. A música de trabalho, ‘‘Cintura da Muleca’’, será o cartão de visitas da dupla fora de Curitiba. ‘‘Então pega na cintura da muleca / Vai rebolando na festa / Fazendo a poeira subir / Fazendo a loirinha sorrir’’, diz a letra.

Eric & Matheus, na verdade Joel e Almir, também têm um registro de show pronto para ser lançado. ‘‘Antes se gravava com orquestra, em estúdios de ponta. Já o som do sertanejo atual é mais cru, com menos instrumentos. Daí a moda dos CDs e DVDs ao vivo’’, explica Matheus.

Aos 33 anos, o cantor conta que trilhou um longo caminho nos bares de MPB antes de assumir sua porção sertaneja. A história de seu parceiro é diferente. A bordo da dupla Eric & Henrique, ele chegou a emplacar um quase-sucesso nas rádios (‘‘Pele de Maçã’’, alguém se lembra?) e assinou contrato com a gravadora BMG. Colocada na geladeira pela multinacional do disco, os dois entraram numa fase de desentendimento e acabaram se separando.

Com toda essa bagagem, Eric & Matheus se preparam para invadir as rádios brasileiras com a candidata a hit ‘‘Alô’’. Eis o refrão: ‘‘Alô, tô num bar / Chego já / Tô aqui batendo um papo, tomando uma gelada / Pode ir fazendo a cama pra que tem ama’’. Vai para o trono ou não vai?

por OMAR GODOY
com fotos de THEO MARQUES (turma)
e MARCOS BORGES (Gurlan, duplas)
maio de 2008

Um comentário :

NERI DA ROSA disse...

Conheço o Theo Marques que fez as fotos. Confirmado o UV "O Último A Sair" - Quinta, 18/dez - a Sônia sugeriu que a gente comece um pouco mais cedo, a partir das 17:00h - estaremos lá.

Se não pedir demais, inclua o Six Degrees (tua ex-onemanband) no list.

Já te linkei no meu export-blog:

uv-brazil.blogspot.com

yes,
neri
\9916-0001