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ANIMAIS SENTIMENTAIS

Laboratório de Bem-Estar Animal
pesquisa a diminuição do sofrimento dos bichos

Carla Molento defende a idéia de ‘‘guarda responsável’’ dos bichos


Os bichos nunca sofreram tanto nas mãos dos humanos como nos dias de hoje. É o que garante a médica veterinária Carla Molento, professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Ela fundou e coordena o Labea - Laboratório de Bem-Estar Animal da universidade, que desde 2004 pesquisa estratégias para a diminuição do sofrimento de espécies de companhia e produção.

Carla não tem dúvidas de que as criaturas irracionais têm sentimentos. Ou, para usar um termo técnico, são seres sencientes - com capacidade de sentir dor e prazer. Principalmente os vertebrados, cuja proteção da medula nervosa é semelhante a dos humanos.

De acordo com ela, as evidências científicas são muitas. A começar pela mais básica: quando uma presa foge de um predador, é porque está com medo. ''Nesse caso, esse sentimento é muito útil para a sobrevivência e evolução da espécie'', explica.

Há, ainda, situações difíceis de se explicar sem recorrer ao conceito de senciência. Os cefalópodes (lulas e polvos), por exemplo, apresentam comportamento lúdico. ''Eles gostam de brincar, têm prazer com isso'', afirma Carla.

Seja como for, é importante não cair na tentação do antropomorfismo, da humanização. Para a professora, o pesquisador da área de bem-estar deve ter o senso crítico aguçado e sempre levar em conta a perspectiva dos animais. Por outro lado, o uso da empatia e da compaixão para lidar com os bichos é fundamental.

O enriquecmento dessa relação passa, necessariamente, pela idéia de guarda responsável. ''Se você tem um animal, ele está sob sua tutela, como uma criança'', compara Carla. Sendo assim, é uma obrigação cuidar da saúde, oferecer um ambiente adequado e supervisionar a circulação dos bichos e de sua prole.

Ela cita a grande quantidade de cães e gatos soltos pelas ruas. A maioria é considerada semi-domiciliada, ou seja, volta para casa apenas para comer e dormir. Mas enquanto estão por aí, representam um risco em dose tripla: para si mesmos, outros animais e as pessoas.

O Labea, aliás, desenvolve um projeto de extensão na área de controle populacional de cães. Também pesquisa o abate humanitário de peixes, que podem ser insensibilizados por uma técnica de secção da medula. Tirar da água e deixar morrer naturalmente está fora de cogitação.

''A asfixia é o método mais comum para matar os peixes. Mas é uma morte lenta e sofrida'', afirma a professora. ''Ninguém acharia normal ver um cão se afogando, que é a mesma coisa''.

Mesmo os ornamentais têm sua carga de sofrimento. Estima-se que, para cada exemplar exposto em um loja especializada, outros nove morreram no processo de captura e transporte. Para piorar, quem compra não tem informação suficiente para criar da maneira mais indicada.

Mas são os suínos e as aves poedeiras as maiores vítimas da insensibilidade humana. Confinados em espaços minúsculos, nos quais mal podem se movimentar, atravessam sua curta existência numa situação de tortura.

Para se ter uma idéia, um frango criado ao natural pode viver anos. Já o destinado ao abate dura apenas 42 dias - e passa esse tempo em um espaço que o impede de abrir as asas. ''Quem come carne não pode se dar ao luxo de não refletir sobre isso'', diz Carla.

Nos países desenvolvidos, sobretudo os da União Européia, essa reflexão já evoluiu para a ação. Muitos importadores de carne têm exigido dos produtores uma espécie de selo de qualidade, uma certificação de que os animais foram criados de acordo com o conceito de bem-estar.

Com isso, também se iniciou uma corrida dos frigoríficos brasileiros para ajustar seus métodos de abate - e um aumento no campo de trabalho para os veterinários especializados na área. ''A demanda do consumidor é que vai inverter essa situação'', afirma a professora.

Se a mudança não vem pela via da generosidade, que venha pelo poder do mercado.

EM DEFESA DE RITA LEE

O campo de atuação dos profissionais da área ainda inclui o diagnóstico da qualidade de vida de animais utilizados em experiências científicas e atividades de lazer - como rodeios, provas hípicas, zoológicos e circos.

Recentemente, um grupo de estudantes do Labea produziu o laudo técnico que comprovou a situação precária de cinco leões de um circo em Antonina. Os animais agora estão no zoo de Curitiba. ''Analisamos a intensidade e a duração do sofrimento, além da quantidade de indivíduos colocados nessa condição'', explica Carla Molento.

Amanhã, a professora estará em Barretos (SP), onde foi requisitada para uma tarefa que pouco tem a ver com seu trabalho de campo. Ela servirá de ''testemunha técnica'' de defesa da cantora Rita Lee, processada pelos organizadores da Festa do Peão - cuja edição deste ano começa na mesma noite. Como é notório, a artista, defensora dos animais, costuma aproveitar seu espaço nos meios de comunicação para protestar contra os rodeios.

''Não precisa ser da área para saber que aqueles animais são maltratados'', diz Carla. Para ela, não há sequer uma tradição cultural que justifique o uso de animais em rodeios. ''Se ainda estivéssemos falando do manejo gaúcho, tudo bem. Mas a festa de Barretos é totalmente americanizada. Além disso, a cultura é dinâmica, acompanha as mudanças da sociedade'', afirma.

A professora ainda cita uma pesquisa científica sobre o tema que realizou no Noroeste do Paraná. ''A maioria dos entrevistados, frequentadores desses eventos, tem plena consciência de que os animais sofrem. E não se importam tanto com o rodeio em si, e sim com a festa'', conclui.

por OMAR GODOY
com foto de LETÍCIA MOREIRA
agosto de 2008

O JARDINEIRO FIEL

Prochin e o muro da polêmica: heras para evitar as pichações

Envolvido com processos judiciais de segunda a sexta-feira, o procurador da Fazenda Nacional José Carlos Prochin, 61 anos, não quer saber de ócio nas horas vagas. Muito pelo contrário.

Nos fins de semana, ele arregaça as mangas e sai pelas ruas do bairro Jardim Botânico plantando flores e mudas em calçadas, muros e terrenos baldios. Detalhe: Prochin não faz parte de nenhum grupo ambientalista, e nem quer fazer.

''Essa é a minha forma de descansar. Se tiver mais gente no meio, estraga'', afirma, ao ser perguntado se gostaria de deixar algum contato para publicação, caso alguém se interesse em ajudá-lo.

Morador daquela região, o jardineiro solitário conta que escolheu viver em Curitiba após ter passado por São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. ''Estudei aqui nos anos 60 e guardei essa imagem de cidade limpa, com muitas flores nas ruas'', conta.

Hoje, no entanto, ele tem outra opinião. ''Curitiba ainda mantém algumas dessas características, mas está decaindo. O sul do país tem adotado, cada vez mais, uma cultura generalizada, nivelada por baixo'', lamenta. Para Prochin, o problema é que as pessoas só se preocupam em cuidar de suas casas. ''Da soleira para fora, a prefeitura que se vire'', ironiza.

Desde o início de sua jornada, há cerca de cinco anos, o procurador plantou milhares de mudas bairro afora. Ao longo da linha do trem, por exemplo, foram mais de 300 bambus da índia.

Mas há quem não compreenda - ou não aceite - sua proposta. Como a administração de um condomínio que simplesmente arrancou as heras (trepadeiras) plantadas por ele em um dos muros preferidos dos pichadores da região. ''Eles alegaram que aquilo daria muito trabalho para cuidar'', diz.

Obstinado, Prochin não desistiu e fez uma campanha de esclarecimento junto aos moradores do conjunto. Provou que sua iniciativa não servia apenas para melhorar a aparência do lugar - também valorizaria o imóvel no mercado. Diante desse argumento, não houve quem não o apoiasse. E agora as heras crescem à vontade pelo muro.

Para o futuro, o procurador pretende comprar uma caminhonete, que facilitará o seu trabalho. Enquanto isso, segue plantando mudas e recolhendo o lixo das ruas durante sua caminhada para o escritório - outra de suas manias. ''O pessoal acha estranho quando me vê com uma pasta executiva numa mão e um saco cheio de lixo na outra'', reconhece, bem-humorado.

por OMAR GODOY
com foto de LETÍCIA MOREIRA
setembro de 2008

CASA ECOLÓGICA = BURACO DE TATU

Ramina: "Já construiu uma casa? É um saco, um estresse"


Traçar um perfil de Rodolpho Ramina, 53 anos, neste espaço reduzido é uma tarefa complicada. Só o seu currículo completo já ocuparia meia página. Não custa tentar...

Engenheiro civil e economista, fez mestrado na Universidade de Melbourne (Austrália) e pós-doutorado em Harvard (EUA). Trabalha, há mais de 30 anos, em projetos de infra-estrutura, meio ambiente e desenvolvimento. Viajou pelo mundo inteiro. Foi secretário de Planejamento em Campo Largo. Produziu programas de rádio e televisão. Pinta e expõe aquarelas. E agora quer construir casas populares para vender na internet.

Há 18 anos, Ramina deixou Curitiba para morar num sítio em Campo Largo. Lá, plantou cerca de 2.500 pinheiros e mantém uma produção sustentável de erva-mate. Hoje, não troca por nada o sossego da casa feita com diversos materiais recicláveis. ''Aqui você fica mais conectado à chuva, ao sol, às mudanças da lua, das estações'', diz.

No ano passado, o engenheiro ganhou destaque na imprensa por se posicionar contra a construção do metrô em Curitiba. Em seu artigos, defendeu a idéia de que os congestionamentos no trânsito não são uma doença, e sim um dos sintomas do problema maior: a grande concentração urbana na capital.

''A solução é investir na Região Metropolitana. Porque se você andar até 30 quilômetros da cidade, é tudo um caos. Mas depois de 60 quilômetros, é um vazio só'', opina.

Sobre o projeto das casas populares, Ramina garante que se tratam de moradias ''muito sofisticadas'', com aquecimento solar, madeira de reflorestamento e estrutura reciclável. A ordem é facilitar a compra (daí a utilização da internet) e minimizar ao máximo o impacto ambiental. ''Casa ecológica é buraco de tatu. Toda casa causa algum impacto'', brinca.

O bom humor se estende ao nome de sua empresa. A título de registro, chama-se U&A Engenharia e Planejamento. Mas é a sigla para Úlcera & Azia. ''Já construiu uma casa? É um saco, um estresse. Casais chegam a brigar por causa disso'', explica o engenheiro, que promete inaugurar o site até o fim de 2009.

por OMAR GODOY
com foto de MARCOS BORGES
agosto de 2008