A CIÊNCIA DA VENDA

Tecnologia, networking e formação superior
são as novas armas dos vendedores

Reginaldo vem de Pato Branco para assistir às aulas do MBA
Para Rafaela, não há mais espaço para vendedores "provisórios"


Todas as sextas-feiras, Reginaldo Lira, 29 anos, deixa a família em Pato Branco (Sudoeste do Paraná) e enfrenta algumas horas de ônibus até chegar em Curitiba. Gerente comercial de um frigorífico, ele vem à capital para assistir às aulas de um MBA Executivo em Gestão Estratégica de Vendas.

Como os outros 18 alunos da turma, Lira incorpora o novo perfil do profissional da área comercial. O vendedor "folclórico" - intuitivo, esperto e bom de papo - está com os dias contados. O cenário atual exige homens e mulheres mais cerebrais, preparados para uma competição que só aumenta.

Com a estabilização da moeda, a partir dos anos 90, a concorrência entre empresas aumentou. Hoje, o ambiente de negócios tem mais jogadores, que oferecem produtos com características e preços bastante semelhantes. Nessa realidade, o caminho do sucesso depende basicamente de dois elementos: planejamento e, principalmente, informação.

Informação sobre o mercado, produtos, clientes, concorrentes, etc. Quanto mais embasado o vendedor estiver antes de uma visita, melhor será o resultado. Daí a necessidade de se buscar uma formação especializada. Porque, do outro lado do balcão, também há gente muito capacitada.

Cada vez mais, os responsáveis pelos setores de compras das companhias são treinados na arte na negociação. E mesmo o consumidor comum, do varejo, tem mais ferramentas para garantir um bom negócio. Compradores de carros e imóveis, por exemplo, invariavelmente fazem pesquisas na internet antes de ir para a rua.

Enfim: a era romântica acabou. É hora de entender a ciência da venda, que inclui técnicas de negociação, planejamento estratégico e até noções de programação neurolinguistica.

Para isso, é preciso investir em si mesmo. Na turma de Reginaldo, alguns alunos até recebem bolsas parciais das empresas em que trabalham. Mas a grande maioria tira do bolso os R$ 470 mensais do curso (o custo total de um ano e meio de aulas fica em torno de R$ 10 mil).

Alessandro Lunardon, 37, é o diretor executivo da escola, cr
iada em 2002 e a primeira no Brasil a ter um curso superior em Gestão Estratégica de Vendas reconhecido pelo Ministério da Educação. Hoje, são dezenas espalhadas pelo país, que ministram desde módulos de curta duração a MBAs. Um verdadeiro - e milionário - mercado de treinamento, que ainda inclui uma imensa oferta de livros, DVDs, revistas, palestras.

CRISE DE IDENTIDADE

Com mais de 20 anos de experiência no campo comercial, Lunardon acredita que a nova geração está superando uma espécie de "crise de identidade". "Costuma-se dizer que o vendedor é aquele sujeito que não conseguiu ser outra coisa na vida. Isso, felizmente, está mudando", afirma.

Para ele, a questão está na diferença entre ser e estar vendedor. E também no entendimento de que o "apresentador de produtos" deu lugar ao "resolvedor de problemas". O reflexo dessa mentalidade é o surgimento da figura do consultor de vendas, mais atento às necessidades do cliente.

Aliás, são várias as formas de se identificar no cartão de visitas (ainda um dos principais instrumentos de trabalho). Há gerentes e executivos de todos os tipos: comercial, de vendas, negócios, contas... "Mas, no fundo, todos fazem a mesma coisa. Vendem", esclarece Lunardon.

Rafaela Caram, 29, define-se como consultora. Representante de um centro de convenções, vende espaço para a realização de eventos e congressos. Aluna do MBA desde o ano passado, ela conta que ingressou na área comercial por acaso, indicada por uma amiga. Hoje, não quer saber de outra coisa.

"O mercado não abre mais espaço para quem está provisoriamente na condição de vendedor. Agora é a vez dos profissionais", avalia. Formada em Turismo e Hotelaria, Rafaela não busca apenas conhecimento técnico. Para ela, o MBA vale também pela troca de experiências com os colegas. "Eu, que vendo serviços, aprendo muito com quem trabalha em outros nichos", diz.

Apesar das transformações, a essência da atividade não se perdeu. Afinal, por trás de todo o aparato, o sucesso ainda depende basicamente da motivação e da performance individual. "A gente é movido pelo desafio, pelo tesão. Você não imagina o prazer que é fechar um pedido", diz Lira, de Pato Branco.
Nessa hora, o lado aventureiro, quase primitivo, do comércio fala mais alto. "É como voltar para casa com a caça nas costas", compara Lunardon.

NO LUGAR DA PAST, O PALMTOP

Primeira revista técnica sobre vendas do país, a Venda Mais vai completar 15 anos de circulação em abril. Conta com 30 mil assinantes da versão impressa e cerca de 115 mil de seu boletim digital. De quebra, o grupo agencia palestrantes e produz CDs e DVDs de treinamento.

"Somos a maior comunidade de vendas da América Latina", festeja Rodrigo Saporiti, 38, gerente de novos produtos da companhia, sediada em Curitiba. Ele conta que a publicação surgiu de uma necessidade de seu fundador, o empresário Raul Candeloro. "Como não encontrava conteúdo específico em português, o Raul decidiu fundar a própria revista".

De acordo com Saporiti, até o pai de Candeloro, um experiente homem de negócios, viu com desconfiança o lançamento da Venda Mais. "Ele achava que o assunto se esgotaria em oito edições. Mas muitos vendedores treinados pela revista acabam virando coordenadores, e depois fazem assinaturas para a sua equipe. É uma bola de neve", afirma.

Para o gerente, que lida com esse mercado há dez anos, as mudanças recentes na área comercial têm como base a tecnologia. "Em vez da pastinha, o vendedor agora usa celular, notebook, palmtop. Ele pesquisa o site do cliente antes da visita, e já chega conhecendo todas as necessidades do comprador".

Outra novidade é a ampliação temática do treinamento, antes dedicado quase que inteiramente à motivação. A Venda Mais, ele explica, trabalha com um tripé conceitual chamado C.H.A. (Conhecimento, Habilidades e Atitudes). Nesse pacote entram técnicas de neurolinguistica, negociação, abertura e fechamento de pedidos, análise da concorrência, atendimento, fidelização, venda cruzada, etc.

Quanto ao aspecto comportamental, Saporiti garante: foi-se o tempo em que o vendedor empurrava produtos para o consumidor. "Para nós, vender é ajudar o cliente a decidir o que é melhor para ele".

por OMAR GODOY
com fotos de THEO MARQUES
fevereiro de 2009

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