NASCIDO COM OS DISCOS

Jeff Bass: de carteiro a DJ em tempo integral

Jeff Bass tem razões de sobra para comemorar. Um dos DJs locais mais requisitados em outras praças, ele acaba de ser pai pela segunda vez. De quebra, vê aumentar a popularidade de sua festa mensal, a Cambalacho, que completou um ano de atividade na semana passada.

Em um cenário onde eventos desse tipo nascem e morrem com facilidade, chegar ao primeiro aniversário é um feito. Ainda mais por se tratar de um projeto voltado para a black music, gênero um tanto quanto desprezado na terra do sertanejo universitário, da eletrônica mauriçola e do rock jurássico.

Nascido Jeferson Santos há 31 anos, Jeff cresceu ouvindo os LPs do pai, músico de um grupo de samba. "A gente não via muita televisão lá em casa. Era mais rádio e discos", lembra. Nomes como Luiz Gonzaga, Originais do Samba e Commodores fazem parte de sua memória afetiva, desde sempre embalada por ritmos dançantes.

Mas a inclinação para a discotecagem surgiu mesmo com os primeiros astros do hip-hop, ainda nos anos 80. "Pirei quando ouvi o (grupo) Run DMC. Só que eu não fazia a menor idéia de como aquele tipo de música era feito", conta.

O entendimento de que se tratavam de colagens sonoras, produzidas com toca-discos, veio de forma inusitada, por meio do antigo Xou da Xuxa. "O programa tinha um DJ, o My Boy, que um dia mostrou como parar um disco com a mão. Foi ali que eu descobri o que era o scratch", diz.

A técnica de "rabiscar" os LPs, no entanto, não funcionou muito bem em casa. "Eu não sabia que tinha de usar um feltro e acabei tomando uns cascudos do meu pai por ter arranhado os discos dele", diverte-se.

Daí em diante, Jeff não parou mais de pesquisar e praticar. Dançou break, tocou com grupos de rap e começou a discotecar. Logo se destacou nas pistas, mesclando o hip-hop americano com doses de samba-rock, funk e soul genuinamente nacionais. Era o início da revalorização de artistas como Tim Maia, Jorge Ben Jor e Banda Black Rio, ironicamente "descobertos" por colecionadores estrangeiros.

E foi justamente esse interesse pela black music tupiniquim que o levou para duas turnês internacionais. A partir de sua página no portal MySpace, Jeff fez contatos com produtores europeus e marcou datas na Itália, Alemanha, Bélgica, França e Inglaterra. O mesmo aconteceu no Brasil, onde o DJ percorreu praticamente todas as grandes capitais.

Nesse meio tempo, ele largou de vez a profissão de carteiro, que defendeu por quatro anos. "Quando passei a ganhar a mesma coisa para tocar uma, duas vezes por semana, percebi que era a hora de parar de tomar chuva", afirma. Alguma lembrança marcante dos dias nos Correios? "Acho que não. Mas eu usava aquela bolsa para carregar os discos", ironiza.

Enquanto isso, a cena noturna de Curitiba o desanimava cada vez mais. As noites de hip-hop caminhavam para um lado cada vez mais comercial, musicalmente falando, enquanto os projetos alternativos simplesmente não tinham continuidade. Surgiu então a ideia da festa Cambalacho, produzida com os amigos, e também DJs, Anaum e Feiges.

A primeira edição, ele revela, foi um fracasso. Mesmo assim, o trio insistiu em tocar apenas o que quisesse, sem fazer concessões ao público. Até que o evento finalmente vingou - e se mudou do bar Soho para um lugar maior, o Era Só o que Faltava, onde acontece todos os domingos.

"É engraçado. Quando a gente deu as costas para o gosto das pessoas, elas finalmente lotaram a festa", reflete o DJ, que já viajou com a Cambalacho para Brasília, Goiânia, Rio de Janeiro e São Paulo.

Agora, o grupo pretende profissionalizar o projeto, transformando-o numa empresa. Jeff, por sua vez, quer estudar música, para se especializar como produtor. Mas sem tirar os pés do chão.

"Já penei muito, por isso sou realista. Faço questão de passar isso para os outros caras", garante. E exemplifica: "Esses dias, eles ficaram empolgados porque um vídeo da festa teve mais de mil acessos no YouTube. Aí eu mostrei que um outro vídeo, de um gato tocando piano, teve um milhão de acessos. O gato é muito mais famoso que a gente!", brinca.

Equipe Cambalacho

por OMAR GODOY
com foto de THEO MARQUES
março de 2009

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